domingo, 18 de outubro de 2009

As aparências enganam




Não dá pra confiar. Mesmo que no convite, entre os patrocinadores, estejam estampadas as marcas de grandes empresas públicas e privadas. Nem sempre, meu amigo, isso é sinônimo de fartura e qualidade.

Mas fui exatamente pensando o contrário. E nem tinha como não ser. Além do mais, o papel dizia assim: "Você é o nosso convidado para o coquetel de lançamento do projeto...".

Até aí tudo bem. Mas se a ênfase está sendo dada ao coquetel - e foi dada, querendo ou não -, que se dê a devida importância a ele.

No cardápio: três tipos de salgados - que, diga-se, estavam frios, gordurosos e com gosto duvidoso. Pra beber, água e refrigerante. Cerveja gelada que é bom, nada.

No início deu até pra encarar. Afinal, o "evento" estava só começando e a esperança era de que, mais tarde, os pratos quentes ainda pudessem ser servidos. Que nada!

Até o gordinho da mesa ao lado logo começou a recusar os "quitutes". Na presença do garçom, apenas erguia o braço e mostrava a palma da mão em sinal de "pare".

Ao fim, depois da falação típica, um espumantezinho pra salvar a noite e tapear a fome, que àquela altura já corroía meu estômago.

Pelo menos deu pra aguentar, não fosse o cachorro quente da Dona Vera que comi no final da tarde, num trailer perto da faculdade.

Como de praxe, sempre quentinho, saboroso e caprichado. Hummmm ...


Clique aqui e saiba de onde foi retirada a ilustração acima.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

24/7 conectado



TRIMMMMMMMM ... TRIMMMMMMMM!!!!!!!!

Sete e meia da manhã. Ele acorda. Pega o laptop que fica em cima do criado mudo ao lado da cama e o coloca sobre a mesa da cozinha.

Enquanto toma café, acessa as últimas notícias do Brasil e do mundo. Lê textos, vê vídeos e ouve podscasts.

Ele mora em Belo Horizonte, mas é carioca.

No caminho do trabalho, gosta de ouvir, pelo celular, uma famosa rádio fluminense.

Chegando lá, lê e redige e-mails, faz planilhas, ligações. Também aproveita pra convesar com os amigos pelo messenger e acessar redes sociais.

Depois do almoço, se diverte em um site que permite carregar e compartilhar vídeos em formato digital.

Mais e-mails, planilhas, ligações, messenger e redes sociais.

Seis e meia da tarde. Ele chega em casa. Pra relaxar, liga o computador e coloca um sonzinho.

Depois do banho, lembra que baixou um filme de ficção científica na internet e resolve assistir.

Antes de cair no sono, acessa um daqueles sites com milhares de vídeos "educativos" e... Pá, pá, pá, pá...

Feito o "serviço", programa o despertador online, apaga a luz e, exausto, vai dormir.

Bom descanso. Amanhã tem mais.

 
Saiba mais sobre a abreviação 24/7 clicando aqui.
A ilustração deste post foi retirada daqui.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Rock en´rola


O ensaio já dura cerca de uma hora e meia. Pra desespero dos vizinhos, a massaroca sonora ecoa a metros e metros de distância casa afora. Guitarra, baixo, bateria. Como toda boa banda de rock, está tudo ali. Aliás, quase tudo. Ainda falta algo. E a reclamação é constante.

- Cara, temos que dar um jeito, de uma vez por todas. A gente já tem quase um ano de banda e nada de vocalista. Se não formos atrás, ele não vão cair do céu -, esbraveja o baterista, depois de errar um trecho da música e parar de tocar.

O problema poderia ser resolvido facilmente se algum dos integrantes se dispusesse a executar tal tarefa. Mas não era o caso. Nenhum deles se considerava talentoso o suficiente pra tanto.

O ensaio prossegue. Entre erros, acertos, palavras de incentivo e reclamações, eles vão tocando, música atrás de música. E se divertindo também. Afinal, hora do ensaio é momento de descontração, de esquecer dos problemas do dia a dia e tomar umas biritas com os amigos.

Por falar neles, sempre tem um que aparece no meio da tarde pra ver a banda tocar.

Tim! Tóm! ... Tim! Tóm!

- Deve ser o Gutão. Ele ficou de vir às quatro. Vou lá atender -, diz o baterista, morador da casa onde funciona o estúdio improvisado.

Ao abir o portão, uma surpresa. Ao invés do amigo, dá de cara com um sujeito franzino, de cabelos longos na altura do ombro, aparentando uns 28 anos, e com uma quase gimba de cigarro entre os dedos, que vai logo se apresentando:

- Meu nome é Júlio e moro aqui do lado. Sempre ouço vocês tocarem e gosto bastante do som. É que eu sou vocalista e tô procurando uma banda. Será que eu pudia fazer um teste com vocês?

Sem entender direito o que estava se passando, intrigado, o anfitrião o convida pra entrar.

Passados dois anos de ensaios e mais ensaios, além de, claro, muitos desentendimentos e discussões, o quarteto se firma como banda. Pelo menos na parte musical.

Num belo sábado à tarde, o batera perde a paciência e o tempo se fecha novamente.

- Pô, galera, desse jeito não dá. A banda já tem três anos e até hoje não temos site, MySpace, Twitter, Orkut ... Além do mais, precisamos gravar o nosso material de divulgação, correr atrás da mídia, shows, gravadora ...

A reclamação faz sentido. Mas como não se trata de uma daquelas bandas de metal satanistas - o som é um rock alternativo com pitadas de experimentalismo -, talvez eles - incluindo aí o próprio baterista - ainda estejam à espera de ajuda divina.

...

À propósito, alguém se habilita?

A imagem que ilustra este post foi retirada daqui.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

De bar em bar, de mesa em mesa


Sexta-feira à noite. O bar está cheio e movimentado. Enquanto as pessoas se divertem - bebendo, comendo, conversando, dando gargalhadas, namorando -, ela passa de mesa em mesa, numa espécie de via sacra da labuta. Só que no lugar da cruz, carrega uma pequena caixa de chicletes.

- Não, obrigado -, diz um rapaz à menina , interrompendo uma conversa após uma tragada profunda, que encheu o ambiente de fumaça.

Sem esboçar reação, mas com o semblante visivelmente cansado e abatido, a garota parte logo pra outra. Afinal, carrega o peso de ter que vender todos os chicletes no mesmo dia. Ordem da mãe, uma mulher obesa e matrapilha que a observa da esquina, sentada num toco de árvore e com uma garrafa de bebida na mão - parecia conhaque.

- Compra um chiclete? -, perguntou à senhora da mesa ao lado, agarrada a um velho com cara de bêbado.

- Quanto é, mocinha?

- Dois e cinquenta -, dispara.

- Hoje não, obrigado.

- Ah, compra. É pra ajudar lá em casa -, insistiu a menina.

- Humm ... Vou querer esse aqui então, de menta.

Dinheiro pra cá, chiclete pra lá. Depois de colocar o trocado na pochete e agradecer, lá vai ela pra mais uma tentativa, com a destreza de quem, desde cedo, aprendeu a se virar sozinha.

Sem impedir, o garçom fica apenas de olho. Deve ter sido orientado pela direção do estabelecimento a agir  assim. Mas ela não era a única. Outras três ou quatro crianças faziam a mesma coisa, sem direito a descanso.

Tarde da noite, fim do "expediente". Hora de fazer as contas - se é que a mulher da esquina consegue, a essa altura do campeonato - e ir embora. Mas, antes, ela recolhe o que sobrou da mercadoria e põe tudo numa sacola plástica. Com o bolo de dinheiro na mão - pra sorte das crianças-, sorri abobada.

- Cês tão de parabéns! Venderam tudo xxxireitinho. Quem não conseguiu, não precisa ficar triste não. Amanhã é sabado e a mamãe vai dar mais uma chance procês ...

E a história se repete, se repete - infelizmente.

A foto acima foi retirada daqui.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Alô, alô ...

Um senhor baixinho, calvo e de barriga saliente, na faixa dos 80 anos, aguardava na minha frente, na fila do caixa da padaria, para pagar o pãozinho francês que tinha acabado de sair do forno. Era umas seis horas da tarde e o dia tinha acabado de escurecer. Chegada a sua vez, ele colocou o saco de pão em cima do balcão e começou a revirar os bolsos em busca de dinheiro trocado. Segundos depois, pegou uma moeda de R$ 1, entregou à menina do caixa, e saiu. No que deu as costas, voltou.
- Me desculpa, moça, mas me vê também um cartão telefônico. Quanto é?

- Depende.

- Como assim, depende?

- É que tem de 20, 40, 50, 75 ... Qual o senhor vai querer?

- Mas tá caro, hein?

- Não, meu senhor, é a quantidade de créditos -, disse ela, rindo.

- Vou querer o mais barato.

- O de 20 é R$ 2,45.

- Tá bom, pode ser esse.

Enquanto a garota pegava o cartão na parte de baixo do balcão, o homem voltou a revirar os bolsos. Mexia daqui, mexia dali. E nada. De repente, tirou a carteira do bolso de trás da calça e sacou uma nota de R$ 50.

- Acho que mudei de ideia. Vou querer o de 75.

- Tá bom, mas esse é R$ 8,50.

- Tudo bem. É esse mesmo que eu quero. É pra falar com a minha netinha de quinze anos, que mora numa cidadezinha distante daqui, na divisa de Minas com São Paulo ...

- Acho que 75 dá pra falar um bom tempo, né? -, disse sorridente o senhor, olhando pra mim.

Sem ter muita certeza, balancei a cabeça em sinal de positivo. Foi uma reação quase que automática. Não tinha como discordar daquele homem, que estava em estado de graça. Mesmo que aquele cartão rendesse uns míseros cinco minutos de conversa. Mas acho que seria os cinco melhores minutos - quem sabe, talvez os últimos - da vida dele. Mas certamente valeria a pena.

Engraçado como algumas pessoas, principalmente de gerações passadas, ainda carregam hábitos pouco comuns nos dias atuais, como o de comprar cartões telefônicos e falar ao Orelhão. Confesso que nem me lembro mais da última vez que usei um cartão desse tipo. Aliás, já faz um bom tempo que eles sumiram da minha carteira. Mas estavam sempe ali, guardadinhos. Para o caso de uma emergência, dizia minha mãe.

Num mundo praticamente dominado pelos celulares, o cartão telefônico e o telefone público perderam seu espaço. É cada vez mais difícil encontrar pessoas utilizando esse meio, apesar da economia que geram - creio eu. É até estranho pensar que antigamente se enfrentava fila pra fazer ligação. E ai de você se demorasse na prosa. Num instante começavam a resmungar e pedir pra andar logo. Fila em Orelhão é fato raro hoje em dia. Pelo menos no que diz respeito à telefonia pública ...

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Transistando na chuva


É sério! Quase duas horas. Pelos meus cálculos, esse foi o tempo que gastei para percorrer, DE CARRO, do bairro Coração Eucarístico, na região Noroeste da cidade, à Savassi, na Centro-sul. Não fosse a chuva, que começou por volta das 18h - famosa hora do rush ou horário de pico -, levaria, do trabalho à pós-graduação, estourando, quarenta minutos.

Mas poderia ser menos. A chuva, aliada ao tradicional congestionamento que para as avenidas Amazonas e do Contorno, me fez perder um bom tempo no trânsito. No caminho, motoristas mal-humorados e sem paciência; um cruzamento interrompido na Via Expressa, que me fez dar uma volta danada; uma batida entre um carro e um ônibus; e galhos de árvores espalhados pelas ruas.

Achou ruim? Que nada. Poderia ter sido pior, caso tivesse saído naquele horário, quando a chuva caia com mais força e o fluxo de carros era maior. Por isso mesmo resolvi esperar. Além do mais, estava sem guarda-chuva - que não tenho mesmo o costume de carregar - e meu carro estacionado em um local distante de onde costumo parar.

Tirando o tempo perdido e a metade da aula não assistida, a viagem foi até produtiva. Na bagagem: notícias do futebol e da Voz do Brasil - dessa vez ouvi, sim, o noticiário ... e todinho. E com um detalhe: o som de fundo das buzinas alheias. No final das contas, um beep beep mm beep beep yeah, na voz dos Beatles em Drive My Car, teria caído muito melhor.

A foto que ilustra este post foi retirada daqui.