Sexta-feira à noite. O bar está cheio e movimentado. Enquanto as pessoas se divertem - bebendo, comendo, conversando, dando gargalhadas, namorando -, ela passa de mesa em mesa, numa espécie de via sacra da labuta. Só que no lugar da cruz, carrega uma pequena caixa de chicletes.
- Não, obrigado -, diz um rapaz à menina , interrompendo uma conversa após uma tragada profunda, que encheu o ambiente de fumaça.
Sem esboçar reação, mas com o semblante visivelmente cansado e abatido, a garota parte logo pra outra. Afinal, carrega o peso de ter que vender todos os chicletes no mesmo dia. Ordem da mãe, uma mulher obesa e matrapilha que a observa da esquina, sentada num toco de árvore e com uma garrafa de bebida na mão - parecia conhaque.
- Compra um chiclete? -, perguntou à senhora da mesa ao lado, agarrada a um velho com cara de bêbado.
- Quanto é, mocinha?
- Dois e cinquenta -, dispara.
- Hoje não, obrigado.
- Ah, compra. É pra ajudar lá em casa -, insistiu a menina.
- Humm ... Vou querer esse aqui então, de menta.
Dinheiro pra cá, chiclete pra lá. Depois de colocar o trocado na pochete e agradecer, lá vai ela pra mais uma tentativa, com a destreza de quem, desde cedo, aprendeu a se virar sozinha.
Sem impedir, o garçom fica apenas de olho. Deve ter sido orientado pela direção do estabelecimento a agir assim. Mas ela não era a única. Outras três ou quatro crianças faziam a mesma coisa, sem direito a descanso.
Tarde da noite, fim do "expediente". Hora de fazer as contas - se é que a mulher da esquina consegue, a essa altura do campeonato - e ir embora. Mas, antes, ela recolhe o que sobrou da mercadoria e põe tudo numa sacola plástica. Com o bolo de dinheiro na mão - pra sorte das crianças-, sorri abobada.
- Cês tão de parabéns! Venderam tudo xxxireitinho. Quem não conseguiu, não precisa ficar triste não. Amanhã é sabado e a mamãe vai dar mais uma chance procês ...
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